O SILÊNCIO DAS ÁRVORES
É madrugada, e o silêncio cobre a praça, apenas cortado, de quando em vez, pela aragem que agita as copas das árvores.
É precioso este silêncio. Tanto quanto outros, como o dos capuchos que a ele se devotam, porque, ao que se depreende, deus é silêncio. O resto são mundanidades.
E deus reina neste espaço em que a humanidade se recolhe, para que se lhe não conheça a oculta face.
Há, depois, o anúncio de uma mudança. Uma vaga claridade traz à noite um anjo a avisar deus que, em breve, a terra continuará a rodar e virá a manhã e o dia. Deus, lentamente, retira-se para onde o não possam ver.
Eis pois que o dia deflagra e a luz crua tudo invade e, acolitando, o som de carros passando intempestivos, que o sono dos condutores não teve silêncios. Começa o inferno das buzinas, das transgressões dos acossados, raivosos de perder um lugar na fila, que a luta é desalmada, até chegarem ao que julgam ser o seu destino. E aí colocam as suas grilhetas e se entregam ao labor que os inferniza, engolindo imprecações.
Foi-se deus, e o inferno é a sua ausência, quando ao labor falta amor.
Comments
Post a Comment